Kemmitt, G. 2002. Pinta-preta (Alternariose) da batata e tomate. Portuguese translation by Breno Leite, 2007 The Plant Health Instructor. DOI: 10.1094/PHI-I-2007-0123-01
Pinta-preta (Alternariose, pt)
Alternaria solani
Tomate (Lycopersicon esculentum),
Batata (Solanum tuberosum)
Autor
Greg Kemmitt,
Dow AgroSciences
Alternaria solani em folhas de tomate
(Cortesia W.R. Stevenson)
Traduzido por: Breno Leite, University of Florida, NFREC, Quincy, FL
Sintomas e sinais
Os sintomas da pinta-preta (alternariose, pt) ocorrem em frutos, hastes e folhas de tomate e em hastes, folhas e tubérculos de batata. Os sintomas iniciais nas folhas aparecem como pequenas (1-2 mm) lesões castanho-escuras. Em condições ambientais que favorecem à doença, as lesões aumentam e são frequentemente circundadas por um halo amarelo (Figuras 2 e 3). Lesões maiores do que 10 mm em diâmetro apresentam, com freqüência, anéis concêntricos de coloração escura, sintoma altamente característico da pinta-preta (alternariose) (Figura 4). Com a expansão das lesões e o desenvolvimento de novas lesões, folhas inteiras podem tornar-se cloróticas e cair, causando considerável desfolhamento. Com freqüência, as lesões nas hastes apresentam manchas deprimidas, mais claras nas áreas centrais e com a presença típica de anéis concêntricos (Figura 5). Em plantas jovens de tomate, as lesões podem constringir completamente a haste, caracterizando a fase da doença conhecida como podridão mole e aquosa (mela), o que pode reduzir o vigor da planta ou levar à morte.
Figura 2 |
Figura 3 |
Figura 4 |
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Infecções de frutos de tomate verdes e maduros ocorrem normalmente através do cálice com lesões algumas vezes atingindo tamanho considerável (Figura 6). As lesões tornam-se castanhas e podem apresentar os anéis concêntricos característicos e os frutos infectados cairão prematuramente. Sintomas em tubérculos de batata são caracterizados por lesões irregulares, deprimidas (Figura 7), e freqüentemente circundadas por bordas púrpura em relevo. A porção abaixo da superfície da lesão (polpa) do tubérculo apresenta-se seca, coriácea e de cor amarela/castanha. Quando comparadas à outras lesões de tubérculos, as lesões da pinta-preta (alternariose) normalmente secam e são menos vulneráveis à invasão por organismos secundários. Após armazenamento prolongado, tubérculos apresentando sintomas severos podem reduzir em tamanho.
Figura 6 |
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Biologia do patógeno
O agente causal da pinta-preta (alternariose) é o fungo Alternaria solani. Não há estágio sexual conhecido, e portanto, este fungo é classificado como deuteromiceto. O gênero Alternaria representa um grande e importante grupo de fungos patogênicos. Fungos desse grupo causam um número significativo de doenças em várias plantas cultivadas. O fungo é cultivado prontamente em meios artificiais, como por exemplo, o ágar do suco V-8, onde produz colônias pronunciadamente miceliais pigmentadas de coloração cinza-escura. O micélio é haplóide e septado, tornando-se mais pigmentado com o envelhecimento da cultura. A esporulação em cultura pode ser estimulada pela exposição à luz fluorescente. Os conídios são formados individualmente ou numa cadeia dupla em conidióforos distintos. O conídio em forma de clava invertida e com bico pode apresentar de 9 a 11 septos transversais, assim como septos verticais (Figura 8). A variabilidade morfológica e de patogenicidade entre isolados de A. solani sugere a existência de raças, mas até o momento sem confirmação.
Figura 8
Ciclo da doença e epidemiologia
Alternaria solani sobrevive primeiramente em restos da cultura. A pigmentação escura do micélio aumenta a resistência à lise que, em conseqüência, estende o período de sobrevivência no solo por vários anos. Clamidósporos com paredes celulares espessas já foram descritos, mas são considerados raros. Em climas amenos, o patógeno pode sobreviver de uma estação do ano para outra em plantas voluntárias de tomate e batata, ervas daninhas da família das solanáceas e em plantas de tomate e batata selvagem.
Condições ambientais quentes e úmidas (24-29°C/75-84°F) são consideradas ótimas para a infecção. Na presença de saturação de umidade (com formação de filme d’água) e em temperaturas variando entre 28-30°C (82-86°F), os conídios germinam em aproximadamente 40 minutos. Os tubos germinativos ressecados podem retomar o crescimento quando reidratados. Desta maneira, a infecção pode ocorrer em situações em que períodos de umidade e seca alternam-se. Tubos germinativos penetram a epiderme da folha diretamente ou entram pelos estômatos (estomas, pt). A infecção dos tubérculos usualmente ocorre através de ferimentos na superfície do tubérculo. Ferimentos causados durante a colheita e que coincidem com condições favoráveis de umidade para germinação de esporos podem levar à perdas significativas. Altos níveis de umidade no solo podem causar inchamento das lenticelas nos tubérculos, as quais podem ser facilmente invadidas pelo patógeno.
O tempo entre o início da infecção e o aparecimento de sintomas nas folhas é dependente das condições ambientais, idade da folha e a suscetibilidade do cultivar. A pinta-preta (alternariose) é uma doença de tecidos vegetais em processo de envelhecimento. As lesões aparecem rapidamente em ambiente quente e úmido sobre folhas envelhecidas e são normalmente visíveis entre 5 e 7 dias após a inoculação.
Períodos longos de umidade são requeridos para a esporulação, que também pode ocorrer em ocasiões em que períodos de seca e umidade alternam-se. Conidióforos são produzidos durante noites úmidas e no dia seguinte. A combinação de luz e períodos de seca induzem a produção de esporos, os quais emergem na segunda noite com umidade. A pinta-preta (alternariose) é considerada uma doença policíclica com repetidos ciclos de novas infecções. A dispersão secundária de conídios é principalmente promovida pelo vento e ocasionalmente por respingos d'água.
Manejo (Meios de luta, pt) da doença
Práticas Culturais
O emprego de boas práticas culturais visando manter as plantas de tomate e batata em condições aceitáveis de sanidade, pode manter os danos causados pela pinta-preta (alternariose) abaixo dos níveis econômicos. Uma vez que o patógeno sobrevive em restos de cultura infectados, práticas básicas de sanidade que reduzem o inóculo inicial são benéficas para os cultivos subseqüentes. Atenção especial deve ser devotada à remoção de material infectado, como por exemplo, restos de cultura em decomposição (plantas e frutos) encontrados nas áreas próximas dos campos de produção. Controle de plantas voluntárias e ervas daninhas, como tomate e batata selvagens (e outras solanáceas), são práticas de rotina importantes antes do estabelecimento de novas áreas de cultivo. Tais plantas são hospedeiras do patógeno e, uma vez removidas, reduzem os riscos de transmissão da doença. Sementes e material de transplante livres de patógenos e rotação com uma cultura não suscetível irão igualmente auxiliar na redução de inóculo no solo.
A maturidade do tubérculo é o fator mais importante a ser considerado para o controle da infecção. Tubérculos colhidos antes da maturação são suscetíveis à ferimentos e subseqüente infecção. A infecção de tubérculos pode ser reduzida com uma colheita cuidadosa para minimizar os ferimentos. Sempre que possível, deve-se evitar a colheita em condições de excesso de umidade. Os tubérculos devem ser armazenados em temperaturas variando entre 10°C e 13°C (50-55°F), em condições de alta umidade relativa e com muito arejamento, para promover o fechamento dos ferimentos. Essa prática reduz a incidência e a severidade das infecções nos tubérculos armazenados.
Figura 9
Durante o cultivo, a programação da irrigação por aspersão deve ser feita de forma a minimizar o período de molhamento foliar (Figura 9). Deve-se evitar situações que propiciam longos períodos de molhamento das folhas, especialmente em dias frios e nublados ou durante as noites. A seleção de áreas de cultivo com boa drenagem e ausência de impedimentos naturais ao fluxo de ar sobre a cultura, isto é, fileiras de árvores, reduzirão o período de molhamento das folhas. A manutenção dos níveis adequados de fertilidade do solo é também um fator crítico para o controle da pinta-preta (alternariose). A doença é muitas vezes associada com cultivos que sofrem com falta de nitrogênio (azoto, pt), particularmente no período final da fase de crescimento e nas folhas mais velhas e em senescência. O manejo (combate, pt) de outras enfermidades, como o (a) tombamento (murchidão, pt) por Verticillium, podem reduzir o estresse e portanto, a severidade da pinta-preta (alternariose).
Cultivares Resistentes
Resistência total à pinta-preta (alternariose) não está disponível em cultivares comerciais de tomate e batata. A utilização de variedades selvagens de tomate que mostraram alto grau de resistência em programas de melhoramento, tem propiciado o lançamento de um grande número de cultivares com alguma resistência à pinta-preta (alternariose). Níveis aparentes de resistência são freqüentemente correlacionados com a idade das plantas. Plantas imaturas de tomate e batata são relativamente resistentes à pinta-preta (alternariose), mas após o início da formação dos tubérculos e frutos, a suscetibilidade aumenta gradualmente. Plantas maduras são bastante suscetíveis.
Figura 10
Controle químico
Fungicidas protetores e curativos são registrados para o uso contra a pinta-preta (alternariose) de tomate e batata (Figura 10). Fungicidas de mais baixo custo como mancozeb e clorotalonil representam os pilares da maior parte dos programas de manejo (luta, pt) da doença. Esses fungicidas devem ser aplicados em intevalos de 7 a 10 dias para prover proteção de brotações, assim como, para contrapor o efeito do ambiente na remoção natural e progressiva dos produtos químicos aplicados sobre a superfície das folhas. As vantagens desse tipo de produtos incluem a sua eficácia e o modo de ação em múltiplos sítios, o que reduz o risco de desenvolvimento de isolados resistentes na população do patógeno. As desvantagens incluem a necessidade de aplicações regulares em doses relativamente altas.
Um novo produto disponível para controle da pinta-preta (alternariose) é a azoxistrobina. Essa molécula pertence à classe das estrobilurinas, fungicidas que são altamente ativos contra um grande número de fungos. A azoxistrobina é absorvida prontamente pelos tecidos da planta e tem ação preventiva para bloquear a infecção. A azoxistrobina também age curativa/sistemicamente no controle de infecções já existentes. As dosagens utilizadas são mais baixas do que nos produtos protetores convencionais, muito embora o custo por hectare seja tipicamente mais alto. Em função do seu modo de ação em um único sítio, a azoxistrobina apresenta maior risco de desenvolvimento de isolados resistentes na população do patógeno. Sendo assim, durante o programa de aplicação de fungicidas, é preciso alternar o uso de azoxistrobina ou misturá–la com produtos que apresentam modos de ação distintos. Esta estratégia permite cobrir todo o período necessário de aplicações, que não deve incluir mais do que seis tratamentos com este produto. O “Fungicide Resistance Action Committee” (FRAC) não recomenda o uso de estrobilurinas como forma curativa. A época das aplicações de fungicidas em função das condições ambientais e o monitoramento do potencial para desenvolvimento de doença são críticos para se atingir um bom controle. O uso de programas de previsão de doença, como o FAST (Forecasting Alternaria solani in Tomatoes) para a cultura do tomate e o P-DAY (Physiological days) para batata, contribuem para corretamente programar as aplicações e aumentar a eficiência dos produtos fungicidas, como também auxiliar na redução de aplicações e custo (Figuras 11 e 12).
Figura 11
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Figura 12
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Significância
O tomate e a batata são culturas que foram recentemente adotadas, se considerarmos a história da agricultura moderna. Cultivos em larga escala ganharam importância em grande parte no início do século 19, mais ou menos 300 anos após a introdução dessas culturas na Europa, provenientes da região andina da América do Sul. A cultura do tomate foi considerada inicialmente uma atividade de pequenas propriedades. No entanto, o desenvolvimento da indústria de processamento de alimentos e a necessidade de grandes quantidades a baixos custos estimularam a produção em larga escala, particularmente nos Estados Unidos da América. A produção mundial de tomate no ano 2000 foi de aproximadamente 98 milhões de toneladas. A batata, por sua vez, sendo um suplemento alimentar em quase todos os países de clima temperado, apresentou produção anual de 311 milhões de toneladas no ano de 2000.
A distribuição da pinta-preta (alternariose) é mundial e essencialmente ocorre onde o tomate e a batata são cultivados. Nos Estados Unidos, a pinta-preta (alternariose) do tomate pode ser problemática na porção do país à leste das Montanhas Rochosas, contudo não é um problema nas regiões menos úmidas entre as montanhas ou na costa do Pacífico. Sem controle, a doença pode causar desfolhamento e redução do tamanho e número de frutos. Em batata, a doença ocorre praticamente todos os anos na maior parte das áreas de produção, porém somente causando impacto na produção quando o molhamento das folhas favorece o rápido desenvolvimento de sintomas.
A estimativa anual de perdas de produção por qualquer doença é difícil de ser feita com precisão. Valores encontrados na literatura para avaliar perdas em decorrência da pinta-preta (alternariose) em campos não tratados variam enormemente, entre 5% e 78%. Projeções seguras de gastos com fungicidas para o controle da doença são também difíceis de serem determinadas. A razão para essa dificuldade é a existência de um complexo de patógenos que atacam o tomate e a batata e que são normalmente controlados com os mesmos produtos. Estimativas confiáveis sugerem que os gastos anuais globais com fungicidas para o controle de Alternaria spp. estão em torno de 32 milhões de dólares para a cultura do tomate e 45 milhões de dólares para a cultura da batata.
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